Umdoicinco e Duquinhentu

Umdoicinco e Duquinhentu

Íamos, minha esposa eu, de São Paulo para Campanha pela Rodovia Fernão Dias, quando passávamos por Estiva, Sul de Minas, foram aparecendo à margem da estrada, barracas de frutas.

Em cartazes improvisados com pedaços rasgados de lona de caminhão, e escritos de maneira grosseira à broxa, liam-se os nomes dos produtos à venda.

Logo que minha companheira de viagem viu que uma das barracas tinha caqui, fruta que ela tanto gosta, encostamos o carro e pedimos pela fruta.

Mas a moça nos disse:

— Caqui não tem mais.

Ficou só mesmo a placa, muita alta no poste que a moça baixinha não alcançava para corrigir.

Seguimos em frente, sempre atentos para ver se aparecia alguma banca que vendesse caqui ou lichia, mas não aparecia nenhuma. Já havia passado a época delas.

Um pouco mais à frente, paramos em mais uma barraca na qual só havia mexerica e perguntei o preço do saco de fruta.

A resposta rápida como um disparo e ininteligível como um balbuciar de bêbado me fez sentir meio estrangeiro em minha própria terra. Olhei para minha esposa e pela expressão no seu rosto, também não tinha entendido nada. Fiquei meio sem jeito, mas perguntei de novo e a resposta foi outra carreira — “umdoicinco…”.

Pensei, que diabos esse cara tá falando?

Aí minha esposa perguntou e ele respondeu lentamente, ou pelo menos a uma velocidade que foi possível entender:

— “Um-é-doi- trei-é-cincu”.

O rapaz deve ter pensando que nós éramos muitos lentos ou burros, mas finalmente conseguimos entender. Um pacote custava dois reais ou três por cinco reais.

Com toda essa nossa dificuldade para entender é de admirar que ele não tenha aumentado o preço ou até fez isso e nem entendemos.

Compramos os três sacos da mexerica, que mesmo quente estava um delícia e fomos comentando sobre o “causu”.

Isso me fez lembrar outro que aconteceu há anos, quando ia de ônibus para Campanha passar o Natal e fizemos uma parada em Pouso Alegre.

Aproveitei para descer, comer um enroladinho de queijo derretido e um refrigerante. Naquela época eu ainda não era vegetariano e adorava queijo.

Quando a garçonete apareceu para atender os passageiros que desceram para fazer um lanche, pedi um Guaraná.

Ao que ela respondeu com uma pergunta:

— “Duquinhentu”?

A minha cara de paulistano de “num tô intendendu”, foi a mesma.

Por alguns instantes tentei ver se “tinha alguma luz”, entender o que a moça havia falado, se tinha uma intuição, insight, se o som do que ela me disse era parecido com alguma coisa que pudesse relacionar com refrigerante. Quem sabe era algum tipo novo, além do normal, diet, agora vai ver tem o “duquinhentu”.

Mas nada de entender! Então corajosamente perguntei, meio preocupado em não parecer burro ou lesado e ela respondeu:

— “Você qué a du quinhentu?”.

Eu queria mesmo era entender o que ela falava, mas faltava contexto, ou inteligência da minha parte.

Detesto quando não entendo alguma coisa e pior ainda quando é algo simples. Mas tem algo que odeio mais, dizer que entendi algo que de fato, não entendi. Meu orgulho é grande, porém minha curiosidade e vontade de entender são maiores. Um pouco…

Então falei que não tinha entendido ainda. Ela, já sem muita paciência, pegou uma lata e uma garrafa de Guaraná e falou:

— Tem a latinha e tem a garrafa de 500.

Pensei:

— Ah… agora eu entendi!

Pedi a “duquinhento” e “doiroladinhodiqueiju”.

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